terça-feira, 4 de setembro de 2007

Histórias - "Diga há Maria..."

Era comum, em determinadas épocas do ano, ver na "olmeda" ciganos acampados.

Um belo dia num acampamento com várias famílias ciganas, estavam alguns ciganos a almoçar, como era costume, sentados no chão com as pernas cruzadas e com a malga no meio das pernas.

Ora nesse dia, uma cigana ainda nova estava sentada e a saia subiu deixando ver o que havia por baixo.

Em frente dela estava um cigano ainda adolescente, que reparou e depressa o sangue lhe começou a correr nas veias.

Dirigiu-se há mãe e exclamou:

- Ahhh! Mãe, diga há Maria que abaixe a saia, senão arramo o caldo ca bicha!

sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Histórias - "Para que saibas..."

Na segunda metade do século XX, ainda durante a ditadura, não era frequente a mesa farta. Vitela, cordeiro e outro tipos alimentos eram escassos, logo comiam-se principalmente em dias de festa, mas muita gente nem nesses dias.

Ora, um Caçarelhense, num dia de festa de S. Sebastião, que em Caçarelhos se realiza no Inverno. Foi à Missa, e quando chegou a casa e sentou-se no escano, depois da mulher ter posto a perguiçeira, começaram a comer, tinham para o almoço posta de vitela mirandesa assada na brasa.

Enquanto comiam, o Bébé começou a chorar.

Foram almoçando e fazendo comentários sobre a vida na aldeia, e sobre o que tinha acontecido na missa nesse dia! Nisto a mulher levanta-se para mudar a fralda ao bébé, colocando a fralda suja na beira do escano.

O homem já no fim da refeição empolgado com a conversa e com pressa para ir ver os preparativos para o arraial. Pega na fralda, pensando que era um rodilho, e fica com a cara suja. Não se apercebendo sai porta fora.

Cruza-se com um homem que ia também para o arraial, que exclama:

- Vais mui untado!

Ao ouvir o comentário, pensando que o outro se referia ao facto de ter comido vitela, responde:

- Para que saibas quem la come!

- Bem vejo! - retorquiu o outro.

domingo, 1 de julho de 2007

Histórias - "Garoto onde está teu pai..."


Era normal vermos chegar a Caçarelhos a cavalo nas suas mulas alguns negociantes de peles. Eram naturais da aldeia de Argoselo e eram conhecidos por "peliqueiros" (pronuncia-se engrossando a voz), percorriam as aldeias vizinhas comprando a pele dos animais que eram mortos para consumo.


Ora havia um "peliqueiro" a quem adoeceu uma mula. Preocupado, uma vez que era o seu meio de transporte, e meio de transportar a carga, resolveu fazer uma promessa a S. Bartolomeu, santo de grande devoção dos habitantes de Argoselo.


Dirigiu-se à capela de S. Bartolomeu. Quando o viu passar, o sácristão resolveu ir ver o que ia fazer. Quando entrou na sacristia, ouviu o "peliqueiro" que orava em voz alta:


- Meu S. Bartelameu, como sabeis tenho uma mula doente, se ma salvares dou-te um saco de trigo, mas se não a salvares venho e racho-vos em dois!


Preocupado o sácristão foi acompanhado o estado de saúde da mula. Quando soube que Mula morrera dirigiu à pressa para a capela e trocou a imagem do santo por uma mais pequena. Mal tinha acabado de o fazer dirigiu-se à sacristia e esperou. Momentos depois entra o "peliqueiro" de machado em punho. Quando já tinha o machado no ar reparou que o santo era mais pequeno, perguntou gritando:


- Garoto onde está teu pai?

sábado, 30 de junho de 2007

Histórias - "Motoretas"


Havia em Angueira (Aldeia que dista 5 KM de Caçarelhos) um homem, que customava percorrer de motorizada as aldeias vizinhas, devido a afazeres profissionais.
Gostava de beber uns canecos bem bebidos, pelo que era frequentador dos cafés e tavernas da zona.

Um belo dia à noite sai do café de Caçarelhos, já muito bebido, põe-se a cavalo na motorizada, e quando chega à recta dos pascoais avista duas luzes e pensou:

- São duas motoretas!

Decidiu então meter-se pelo meio delas, mas afinal era um carro. Não fora a perícia do condutor do carro e teria havido uma desgraça.
Meses depois, encontrava-se novamente o nosso homem a sair do café de Caçarelhos no mesmo estado, quando alguém afirma:

- Cuidado com as motoretas!!

Ele pôs-se a cavalo na motorizada e lá foi praguejando, uma vez que quem estava presente caiu numa risota. Ao descer para a ponte de Angueira, o vinho colocou-lhe duas luzes da iluminação pública, na mesma posição dos faróis de um carro. Pensou:

- Foda-se da outra vez pensei que eram motoretas e saiu-me um carro, hoje desvio-me!

Se bem o pensou melhor o fez, só que o vinho fez-lhe perder a reacção e quando se apercebeu, já estava no rio a refrescar a bebedeira.

Tempos Modernos

Recebi há alguns dias um e-Mail que me fez recordar a minha infância, passada em Caçarelhos, apesar de não saber o autor não resisto a partilhá-lo, concerteza trará memórias a muitos naturais de caçarelhos que agora vivem longe!


Nascidos antes de 1986. De acordo com os reguladores e burocratas de hoje,todos nós que nascemos nos anos 60, 70 e princípios de 80, não devíamos ter sobrevivido até hoje, porque as nossas caminhas de bebé eram pintadas com cores bonitas, em tinta à base de chumbo que nós muitas vezes lambíamos e mordíamos. Não tínhamos frascos de medicamentos com tampas "à prova de crianças", ou fechos nos armários e podíamos brincar com as panelas. Quando andávamos de bicicleta, não usávamos capacetes.

Quando éramos pequenos viajávamos em carros sem cintos e airbags, viajar á frente era um bónus. Bebíamos água da mangueira do jardim e não da garrafa e sabia bem. Comíamos batatas fritas, pão com manteiga e bebíamos gasosa com açúcar, mas nunca engordávamos porque estávamos sempre a brincar lá fora. Partilhávamos garrafas e copos com os amigos e nunca morremos disso. Passávamos horas a fazer carrinhos de rolamentos e depois andávamos a grande velocidade pelo monte abaixo, para só depois nos lembrarmos que esquecemos de montar uns travões. Depois de acabarmos num silvado aprendíamos. Saíamos de casa de manhã e brincávamos o dia todo, desde que estivéssemos em casa antes de escurecer. Estávamos incontactáveis e ninguém se importava com isso.

Não tínhamos PlayStation, X Box. Nada de 40 canais de televisão, filmes de vídeo, home cinema, telemóveis, computadores, DVD, Chat na Internet. Tínhamos amigos - se os quiséssemos encontrar íamos á rua. Jogávamos ao elástico e à barra e a bola até doía! Caíamos das árvores, cortávamo-nos, e até partíamos ossos mas sempre sem processos em tribunal. Havia lutas com punhos mas sem sermos processados. Batíamos ás portas de vizinhos e fugíamos e tínhamos mesmo medo de sermos apanhados. Íamos a pé para casa dos amigos. Acreditem ou não íamos a pé para a escola; Não esperávamos que a mamã ou o papá nos levassem.

Criávamos jogos com paus e bolas. Se infringíssemos a lei era impensável os nossos pais nos safarem. Eles estavam do lado da lei.

Esta geração produziu os melhores inventores e desenrascados de sempre. Os últimos 50 anos têm sido uma explosão de inovação e ideias novas. Tínhamos liberdade, fracasso, sucesso e responsabilidade e aprendemos a lidar com tudo. És um deles? Parabéns!


Passa esta mensagem a outros que tiveram a sorte de crescer como verdadeiras crianças, antes dos advogados e governos regularem as nossas vidas, "para nosso bem". Para todos os outros que não têm idade suficiente pensei que gostassem de ler acerca de nós. Isto, meus amigos é surpreendentemente medonho... E talvez ponha um sorriso nos vossos lábios. A maioria dos estudantes que estão hoje nas universidades nasceu em 1986. Chamam-se jovens.

Nunca ouviram "we are the world" e uptown girl conhecem de westlife e não de Billy Joel.
Nunca ouviram falar de Rick Astley, Banarama ou Belinda Carlisle.
Para eles sempre houve uma Alemanha e um Vietname.
A SIDA sempre existiu.
Os CD's sempre existiram.
O Michael Jackson sempre foi branco.
Para eles o John Travolta sempre foi redondo e não conseguem imaginar que aquele gordo fosse um dia um deus da dança.
Acreditam que Missão impossível e Anjos de Charlie são filmes do ano passado.
Não conseguem imaginar a vida sem computadores.
Não acreditam que houve televisão a preto e branco.


Agora vamos ver se estamos a ficar velhos:

1. Entendes o que está escrito acima e sorris.
2. Precisas de dormir mais depois de uma noitada.
3. Os teus amigos estão casados ou a casar.
4. Surpreende-te ver crianças tão á vontade com computadores.
5. Abanas a cabeça ao ver adolescentes com telemóveis.
6. Lembras-te da Gabriela (a primeira vez).
7. Encontras amigos e falas dos bons velhos tempos.
8. Vais encaminhar este e-mail para outros amigos porque achas que vão gostar.


SIM! ESTAMOS A FICAR VELHOS, heheheh , mas tivemos uma infância do caraças!


Muito obrigado ao Autor, sorri e lembrei-me de tantas coisas e esta foi a minha forma de partilhar a mensagem.

quinta-feira, 17 de maio de 2007

Parabéns - Esc. Sec. Miranda do Douro.

Parabéns!!

Uma Equipa da Escola Secundária de Miranda do Douro acaba de ser uma das Vencedoras do Concurso PT ESCOLAS.

Miranda do Douro passa a ter uma das escolas do Futuro, a bem do desenvolvimento do Planalto Mirandês.

sábado, 12 de maio de 2007

Histórias - "Teixugueiro..."

Havia um rapaz, que tinha a alcunha de "J.. Grande", que um dia foi ajudar um vizinho a rachar uns toros de freixo. Como os toros eram grossos, o Homem foi buscar pólvora, e com um trado fazia buracos nos paus, que depois carregava com pólvora e rebentava os toros.

"J... Grande" viu o efeito que a pólvora fazia e resolveu guardar alguma, numa caixa de serilhos que trazia no bolso.

No dia seguinte, como era hábito, foi com as vacas para um sitio chamado Teixugueiro. Quando ía ao fundo da Aldeia, encontrou um homem que lhe perguntou:

- Então, para onde vais hoje?

- Vou rebentar o teixugueiro. - Respondeu convicto.

- Tem juízo rapaz! - disse-lhe o homem.

Mas ele não fez caso. Seguiu para o lameiro com as vacas, quando lá chegou abriu o buqueiro, deixou as vacas entrar e dirigiu-se para uma borda onde havia uns buracos dos ratos e acendeu uma fogueira.
A meio da manhã pegou na caixa de fósforos que tinha a pólvora meteu-a num buraco dos ratos e colocou lá um tição, para fazer rebentar a caixa. Mas nada aconteceu, a pólvora estava húmida. Lembrou-se então de colocar a gorra na frente dos olhos e soprar o tição, bem o pensou melhor o fez, enquanto soprava a pólvora explode!

Ficou então com a cara na zona da barba, toda queimada, depressa correu para casa.

Quando chegou de novo ao fundo da aldeia voltou a encontrar o mesmo homem, que lhe disse:

- Ah! Meu tonto, ias rebentar o Teixugueiro, e ele quase rebentava contigo!

Lá foi o rapaz a correr para casa para lhe fazerem um curativo, e muito gozado foi nos tempos seguintes...

segunda-feira, 7 de maio de 2007

Histórias - "Merecia, mas ..."

Havia em Caçarelhos um cantoneiro, da Câmara Municipal de Vimioso, que era responsável pela manutenção da estrada entre Caçarelhos e Angueira. Era frequente, senão habitual verificar o estado de maturação das melhores uvas, nas vinhas que rodeiam a Estrada.

Ora um belo dia, depois de almoço resolveu obter uma sobremesa gratuíta, se bem o pensou melhor o fez!

Entrou na vinha que tinha as melhores uvas, escolheu uma parreira de uvas "roquete" e deitou ao toro, para não ser visto. Não se apercebendo que o dono estava no fundo da vinha, este apressou-se a apanhar uma pedra e atirou-lhe uma "lapada"* certeira.

O cantoneiro, levanta-se à pressa e exclama:

- Foda-se! Merecia-as mas com tanta força não, Caralho...

* - Pedrada

quarta-feira, 2 de maio de 2007

Histórias - "Multidão"

Em Caçarelhos o uso de alcunhas é frequente, houve em tempos algumas pessoas cuja alcunha era um número, 100, 18 e 40 (já nosso conhecido do post anterior).

Ora o ti "18" era muito brincalhão e sarcástico, ao contrário do ti "40", brincava frequentemente com a sua própria alcunha.

Um belo dia encontrou-se no Reta la rama, com o Ti "40" e um pouco distante andava a escavar um homem a quem chamavam o "100".

Ti "18" sabendo do feitio do Ti "40" não perdeu a oportunidade:

- Ó chico, chamou ele.
- O que foi? respondeu Ti "40" meio desconfiado.
- Já viste quanta gente anda hoje aqui? perguntou o Ti"18".
- Não somos muitos, somos só 3. Respondeu o Ti "40".
- Ora conta lá bem, disse o Ti "18", aqui 18, aí 40 e além 100.

Ti "40" meteu a viola no saco e lá foi à sua vida, bufando...

terça-feira, 1 de maio de 2007

Histórias - "De hoje em um ano..."

Nos anos sessenta do século XX, havia em Caçarelhos um homem a quem chamavam "40". O Ti "40", irritava-se solenemente quando o chamavam pela alcunha. Eram frequentes as brigas e cada vez que ouvia:

- Oh, 40!

Logo retorquia com um chorrilo de insultos:

- Vai-te foder, filho da puta, etc, etc...

Sendo um lavrador remediado, juntava muita gente nos trabalhos agrícolas, mas ninguém ousava pronunciar a palavra. Num dia de trilha, em que tudo tinha corrido bem e colheita tinha sido farta, encontravam todos os trabalhadores à mesa, incluindo um grupo de rapazes que cochichavam entre si:

- Tenho de arranjar maneira de lhe chamar 40, dizia um rapaz.
- Tás louco, respondiam os outros, ele prega-te com um estadulho nas costas!
- Eu consigo, responde o rapaz, querem apostar?

Nisto levanta-se o Ti "40" já meio ébrio, ergue o copo e exclama:

- De hoje em um ano, corra pelo mesmo cano...
- Haja saúde! respondem os trabalhadores.

Levanta-se o rapaz, deixando os outros muito aflitos, ergue o copo e diz:

- Ti Chico, de hoje em vinte, dezanove e um!*
- Si, home, si ... responde o dono da casa todo feliz.

* - façam a soma!

segunda-feira, 30 de abril de 2007

Histórias - "Deus me ajude!"

Houve em tempos em Caçarelhos um homem a quem colocaram a alcunha de "Rachão". O tio "Rachão" tinha mau feitio e era meio surdo, o que o tornava ainda mais desconfiado.

Um belo dia, depois de já ter resmungado com uma série de gente, dirigiu-se com o burro para o tanque da capela, enquanto o animal bebia, deu um pulo para se subir no bicho e afirmou:

- Deus me ajude!

Nesse momento passa por cima do burro e estatéla-se do outro lado, e com os costados no chão a olhar para o lado, a ver se ninguém o viu, volta a afirmar:

- Foda-se! ajuda sim, mas não era preciso tanto!

domingo, 29 de abril de 2007

Histórias - "Cutcho"*


Havia em Caçarelhos um pastor que tinha três filhos, todos rapazes muito afoitos e hábeis caçadores, pelo menos de garganta.

Ora uma bela tarde de verão quase ao escurcer vinha o pastor a descer o Molar, quando ao chegar perto do sobreiro, foi surpreendido pelo lobo que ali lhe abocanhou um cordeiro.
O pastor gritou e logo lhe acudiram os cães e alguns habitantes do fundo da Aldeia, lá conseguiram que o lobo fugisse, não sem antes matar o cordeiro.

Quando chegou a casa o pastor contou o sucedido aos filhos, estes decidiram usar o cordeiro como isco e voltaram a colocá-lo no sítio onde o lobo tinha atacado rebanho. Colocaram o filho mais novo em cima do sobreiro, onde tinha mais visão e onde estava mais seguro, uma vez que era a primeira vez que participava numa espera.

Estava uma bela noite de luar e o sereno de verão tornava a noite agradável, os dois filhos mais velhos depressa se deixaram dormir. Quem não dormia era o mais novo, que no alto do sobreiro tremia, não se sabe, se de frio ou de outra coisa...

Por volta das duas da manhã vê chegar um vulto perto do cordeiro, não podendo acordar os irmãos, apontou a arma, subiu-lhe um calafrio pela espinha e afirmou:

- Cutcho!!!

Nisto acordam os irmaõs e apercebem-se de que o lobo foge a sete pés.

- Pensei que era um perro! - afirmou o mais novo.

* - Nome carinhoso que se dá aos cães.

segunda-feira, 16 de abril de 2007

Histórias - "Pelicos Tortos"

Houve em tempos em Caçarelhos um lavrador, cuja alcunha era "Pelicos Tortos", conhecido de todos por ser extremamente forreta.
Possuia uma terra no "bald'arca" que tinha uma enorme figueira, que carregava de figos no final do verão. Sabendo como o dono era forreta, os rapazes da aldeia roubavam-lhe os figos quase todas as noites.
Uma tarde disse "Pelicos Tortos" para a mulher:
- Maria, faz a ceia cedo, que esta noite vou apanhar quem nos anda a roubar os figos!
Naquele instante passava por ali um rapaz que ouviu a conversa.
Ao escurecer os rapazes à conversa na taverna, ficaram a saber que o nosso personagem estava de guarda aos figos e resolveram dar-lhe uma lição.
Quando chegou a meia noite já "Pelicos Tortos" dormitava empoleirado na figueira, começou então a ouvir ruídos:
- uuuuhhh! uuuuhhh!
Olhou em redor da figueira e viu uma quantidade de vultos brancos, que exclamaram:
- Quando eramos vivos, vinhamos aqui aos figos! Agora que somos mortos vimos pelo "Pelicos Tortos"!
O nosso homem deu corda aos tamancos e correu para casa o mais depressa possível, onde chegou todo borrado. Ora os vultos não eram mais que os rapazes vestidos com lençóis.


Consta que "Pelicos Tortos" nunca mais apanhou os figos...

Trás-os-Montes

Aqui fica o meu tributo ao maior poeta transmontano de todos os tempos:


Um Reino Maravilhoso (Trás-os-Montes)

Vou falar-lhes de um reino maravilhoso.

Embora haja muita gente que diz que não, sempre houve e haverá reinos maravilhosos neste mundo. O que é preciso, para os ver, é que os olhos não percam a virgindade original diante da realidade, e o coração, depois, não hesite.

O que agora vou descrever, meu e de todos os que queiram merecê-lo, não só existe, como é dos mais belos que um ser humano pode imaginar. Senão reparem:

Fica no alto de Portugal, como os ninhos ficam no alto das árvores para que a distância os torne mais impossíveis e apetecidos. Quem o namora cá de baixo, se realmente é rapaz e gosta de ninhos, depois de trepar e atingir a crista do sonho contempla a própria bem-aventurança.

Vê-se primeiro um mar de pedra. Vagas e vagas sideradas, hirtas e hostis, contidas na sua força desmedida pela mão, inexorável dum Deus genesíaco. Tudo parado e mudo.

Apenas se move e se faz ouvir o coração no peito, inquieto, a anunciar o começo duma grande hora.De repente rasga a crosta do silêncio uma voz atroadora:

- Para cá do Marão, mandam os que cá estão!...

Sente-se um calafrio. A vista alarga-se de ânsia e de assombro. Que penedo falou? Que terror respeitoso se apodera de nós?

Mas de nada vale interrogar o grande oceano megalítico, porque o nume invisível ordena:

- Entra!

A gente entra e já está no Reino Maravilhoso.


Miguel Torga

Caçarelhos v.s Camilo

Não sei que contas teria Camilo Castelo Branco com as gentes de Caçarelhos, é contudo deplorável que se tenha vingado de uma ou duas pessoas, em toda a Freguesia de Caçarelhos.

Calisto Elói, não é nem de perto nem de longe, representativo das gentes de Caçarelhos. Gente trabalhadora, possuidora de empreendedorismo, quando fora da terra é certo. Mas fazer das gentes de Caçarelhos um bando de parolos imorais não é correcto.

Seria Calisto Elói um auto-retrato de Camilo Castelo Branco?

Será uma investigação histórica engraçada, se callhar digna de best-seller, e capaz de fazer descer do trono tão pomposo letrista.